terça-feira, 26 de novembro de 2013

O caso “Big brother-EUA”: mistérios de uma ditadura não mais secreta.

Julian Assange, sargento Bradley, Edward Snowden, são hoje personagens importantíssimos no que podemos chamar de caso “Big Brother-EUA”. No âmbito da politica internacional, a saber a relação entre “poder e informação”, ficou claro que nos últimos anos com o advento do primeiro escândalo de espionagem pós guerra fria, com consequências ainda imprevisíveis, que o controle da mídia e da internet depende do controle político da democracia, e que nesse exato momento, devido a liberdade de expressão ainda existente nos EUA, sabemos que a posição de poder e o avanço dos meios de comunicação levam um estado à vigiar seus cidadãos, se estes, os cidadãos assim o deixarem. E que esse mesmo controle sobre os cidadãos se estende para países aliados quando estes não possuem um serviço de inteligencia forte. Deste modo o controle, a vigilância, a espionagem, a segurança de estado, podem gerar uma infraestrutura para uma tirania futura, inéditas até hoje e piores que os totalitarismos do seculo XX. Ver o ato patriótico do governo Bush se estendendo, no governo Obama à todo planeta em nome da guerra contra o terror causou criticas até da fiel aliada dos Estados Unidos na Europa a Alemanha. Toda essa cultura de vigilância eletrônica, do uso oportunista do discurso de combate ao “terror”, assim como a proliferação da criminalidade urbana, cria as bases para o desenvolvimento de tecnologias de espionagem que têm como pretensão fazer da terra, do planeta, do social, um mapa 1:1, destruindo assim qualquer possibilidade de liberdade, de privacidade. Podemos até imaginar um cenário de uma distopia, um roteiro de ficção cientifica, bastaria criar a hipótese que, se o governo americano tivessem drones com sensores cognitivos ligados a computadores quânticos nem nossos pensamentos e sonhos estariam seguros, tal como a ficção cientifica “Minority Report” dirigida por Steven Spilberg mostra de maneira ainda romantizada e utópica a distopia presente em todo desenvolvimento tecnológico digital. O que Snowden, Assange, e Bradley demonstraram é que no centro do capitalismo mundial surge uma cultura política panoptica, que dissolve o político em favor do policial, para usar os termos da filosofia de Michel Foucalt, uma cultura política absolutamente repressora, em flagrante concorrência com a democracia. Os Estados Unidos em conjunto com a Inglaterra espionam países europeus de maneira sistemática para criar vantagens política e econômicas e talvez até militares. Em relação a América Latina; Brasil, Venezuela, e México são os principais alvos da NSA, agencia de inteligência norte americana. Entretanto não deveríamos estar alarmados, a espionagem entre países é tão comum ao longo da história que o que importa é ver quais são as singularidades desse evento, que é a extensão da espionagem para toda a população de um país e não apenas como era feito no passado onde a espionagem se concentrava apenas nas autoridades e nas questões da segurança de estado, isto é, no desenvolvimento cientifico, industrial e militar. O fato do face book, yahoo e a goole, estarem ligados a NSA e à Cia é que é a chave dessa nova questão. Todas as manifestações que estão ocorrendo no mundo desde o inicio da crise econômica foram organizadas usando como meios especialmente o face book, e o google, que gravam todas as mensagens e endereços de navegação, qual seria o objetivo disso? Podemos deduzir que o objetivo inicial é vender para os estados informações precisas de seus cidadães no momento da contra-revolução, isto é, durante a implementação da politica de austeridade, e de repressão aos protestos mundiais. Hoje já sabemos que foi a IBM que rastreou e "cadastrou" as famílias judias na Europa a serviço do estado nazista já na década de trinta. O documentário norte americano "The corporation" mostra em detalhes a colaboração direta da IBM no extermínio de milhões de judeus, pois seus serviços não se limitaram ao rastreamento e cadastramento das famílias a serem executadas, mas também realizaram a contabilidade dos mortos, o assunto é assustador. Na França o Le Monde noticiou, também com base em documentos da NSA cedidos por Snowden, que a espionagem maciça das comunicações telefônicas na França, em apenas 30 dias, entre o final de 2012 e o começo de 2013, levou à interceptação de 70,3 milhões de comunicações. Infelizmente a sociedade civil não dá a atenção devida a essa nova fase da espionagem e uma das causas é que em meio a um turbilhão de fatos, certas operações estratégicas do Império passam como se fosse apenas um "momento", uma noticia do momento e não uma politica econômica sistemática de domíneo da psicologia humana. Em um texto intitulado “Manifesto pro liberdade”, o ex-agente da CIA declara que os documentos por ele tornados público ajudarão a salvar milhões de pessoas da vigilância e da interferência na vida privada. Segundo ele, o escândalo por ele provocado, será útil para a sociedade.“A existência das técnicas de espionagem não deve predeterminar nossa política. Nosso dever moral consiste em procurar que nossos valores e leis limitem os programas de espreita e defendam os direitos humanos”, diz-se no manifesto. Apenas uma visão de totalidade poderia revelar a radicalidade da questão, os governos se movem, o povo se esquece. Não foi atoa que pela primeira vez na história um líder do Brasil, no caso nossa presidente Dilma Roussef mostrou sua indignação realizando na ONU duras criticas à atuação do governo americano. Se pudéssemos olhar agora para o passado para identificar acontecimentos semelhantes ficaríamos confusos com a miríade de acontecimentos que se sobrepõem ao nosso novo velho mundo. Desde 2008 há uma aceleração dos processos históricos, uma série de cadeias de eventos dispares saltam aos olhos nos projetando no futuro, através de um passado, como diria Walter Benjamin, saturado de agoras, que se desenrola como um relâmpago ante nossos olhos. A crise econômica é o epicentro, a crise ecológica o destino, o meio as são novas tecnologia de controle social. A revolução que se segue no mundo antigo; manifestações na Europa e a primavera árabe, acirram os conflitos ante a manipulação da mídia e a intervenção norte americana, em especial no oriente médio. A Primavera árabe e na sequência suas guerras civis se conjugam com os protestos de rua da Europa. Na Asia uma aliança anti-ocidente informalmente se forma, entretanto de maneira intermitente as agitações sociais da Europa e oriente médio avançam sob a roupagem das demandas locais. Na América Latina e na Africa o crescimento econômico entra em contradição com conflitos por terra, étnicos e por direitos, e uma modernidade ainda presa aos paradigmas do seculo XX tenta se posicionar a margem do sistema capitalista, que favoreceu estes países inicialmente com a crise econômica. China, Rússia e EUA concentram o poder politico militar em torno de diferenças econômicas ainda profundas, tanto entre os países, como entre suas classes sociais. Sem diluir o problema em partes é impossível reconstituir o tempo de agora a que Walter Benjamin se referia. Hoje temos uma crise econômica semelhante à crise de 1929, temos uma primavera dos povos semelhante à de 1848, só que esta não é só europeia, se originou na Asia em conjunto com as manifestações contra a "austeridade econômica" na Europa, e se espalha lentamente por todo mundo, e finalmente, para dar uma pitadinha a mais na química, vemos hoje a pressão dos Estados Unidos no oriente médio, em busca de poder e petróleo, que faz renascer o perigoso uso oportunista das religiões, além de apontar para uma terceira guerra mundial já que o Irã é o epicentro máximo de equilíbrio do poder geopolítico, pois se posiciona no centro do globo e das civilizações, estando no centro da Euroásia, sendo o último empecilho sério para que os EUA controlem hoje o “oriente-médio”, e não é atoa que nesse país a internet, google, gmail e face book estejam constantemente sendo bloqueados. Estamos próximos do Armagedom? Agora ouvimos o trovão do relampejar histórico que trás uma nova tempestade.

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Boi de Piranha: Mídia e poder no Brasil.

Big brother I

Boi de Piranha: Mídia e poder no Brasil.

O termo big brother criado por George Orwell designava, em seu livro 1984, o uso indiscriminado de câmeras e televisores apara controlar e vigiar os cidadãos, hoje esse termo pode ser usado de duas formas, a primeira forma que vamos chamar de big brother I, funda-se na vigilância eletrônica e no controle de informações sobre o indivíduo, é o seu sentido clássico e é usada em especial por empresas de segurança, pelo poder público e por empresas como a google o face book. A segunda forma, que deriva da primeira é o uso da propaganda, da publicidade, dos meios de mídia, para enfocar um determinado assunto, desviando a atenção da opinião pública do problema econômico-politico para um problema moral por assim dizer, serve como uma forma de moralizar a consciência do público despolitizando-a.

Sabemos que no poder não há inocentes e que a justiça precisa realizar seu trabalho para combater desvios e vícios do poder. Mas o julgamento do “mensalão” por vezes lembrou os antigos expurgos stalinistas que se utilizaram de uma publicidade imensa para criar no povo uma sensação de justiça, forjando uma situação para desviar a atenção dos problemas sociais e econômicos.

A condenação dos acusados pelo mensalão se deu em um período crítico em que toda as lideranças de esquerda da América Latina passavam. O presidente Fernando Lugo do Paraguai a pouco havia sido deposto, Hugo Chávez entrava na fase final de sua doença, aqui no Brasil a condenação dos acusados por “propina” receberam variadas penas que foram recebidas com ovação pela mídia hegemônica, passando a impressão para os leigos, de que a justiça teria sido feita. A grande questão que levantamos é; porque a mídia enfocou tanto este caso? O fato do supremo tribunal federal ter julgado o caso do mensalão segundo as regras da Constituição não deveria causar espanto em ninguém, entretanto porque a mídia tentou sugerir que o caso do “mensalão” teria sido o maior caso de corrupção da história do país?

Para compreendermos esse “mistério” da superexposição do processo do mensalão via mídia hegemônica basta olharmos a breve história de nossa democracia para ver que inúmeros processos de corrupção se arrastam na justiça e não têm o mesmo enfoque, como o caso “Sudam” por exemplo. Caso envolvendo ex-senadores como Luís Estevão e Jader Barbalho, ou o caso de vendas de decisões judiciais feita por juízes federais desmontada pela operação Anaconda da polícia federal. A própria era de privatizações tucanas passou ilesa pela justiça, e hoje pouco se lembra do mensalão da era Fernando Henrique, que comprou votos para aprovar a reeleição.

Podemos notar claramente que o objetivo da mídia era atacar o governo e apagar a era Lula da memória dos brasileiros associando seu governo à corrupção, justamente em um período em que toda a esquerda latina americana sofria com uma onda de eventos hostis que iam de câncer à processos parlamentares. Fica evidente, se debruçarmos sobre a questão da corrupção no país, que o julgamento do mensalão funcionou como uma espécie de “boi de piranha”, para que a manada de corruptos passa-se, e nela se incluem não apenas parlamentares, mas também empresários, juízes e latifundiários, lobistas e etc. Foi preciso sacrificar os “inimigos” da velha oligarquia se utilizando de meios legais e de uma retórica moral, mas com isso não tiramos o mérito da questão do julgamento nem temos os réus como inocentes, mas sempre devemos desconfiar dos consensos criados pela mídia hegemônica.

Hoje vemos que essa estratégia não é de uso exclusivo deste ou daquele grupo, mas uma conjugação de forças, isto é, ela surge de uma aliança entre um interesse político e o chamado quarto poder. A eleição de do deputado Feliciano para a presidência da comissão de direitos humanos a primeira vista pareceu um grande equivoco por parte do governo, mas quando vemos o escândalo que ela causou na opinião publica e na exposição que a mídia deu, notamos mais uma vez , que a indicação serviu como “boi de piranha” para outras nomeações mais escandalosas e perigosas como e eleição Blairo Maggi, representante da bancada ruralista para a comissão do meio ambiente. A principal função do Big Brother II é eleger e divulgar a questão que é mais relevante para os interesses daqueles a quem ela representa, no caso, a nossa antiga oligarquia serva do imperialismo americano.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

O desvio da regra: diferenciação e inovação.

  A representação social, hegemônica e latente da mentalidade média nos dia de hoje, conjuga materialismo vulgar à um determinismo idealista de diversos matizes, que vão das mais irracionais e mistificadoras concepções, às mais refinadas teorias jurídicas e econômicas. Entretanto não vamos trabalhar aqui a especificidade de cada uma dessas representações, mas veremos um resumo do seu censo comum do seu ponto de convergência.

  O pensamento determinista sugere que todas as pessoas seriam determinadas pela sua condição econômica, e quando beiram o absurdo idealista, que seriam determinadas por suas idéias e valores. O que temos de fato é uma síntese entre os dois pólos. Em relação ao argumento de ordem econômica, sua falha consiste que sua ideologia se baseia em uma pretensão de enquadrar as classes sociais, com seus indivíduos, dentro de suas respectivas funções sociais. Entretanto elas não podem explicar o desvio, isto é, o fato de alguns sujeitos se orientar mais pelas suas convicções morais e políticas do que pela sua condição econômica, por exemplo as determinações econômicas de uma classe social oprimida não explica as formas variadas de resistência e a constituição de representação dispares. Em um mesmo bairro de periferia, mesmo inseridos no ciclo de trabalho e consumo, sendo facetas do mercado e da economia, alguns trabalhadores evangélicos não orientam sua crença para mercado, sendo críticos à teologia da prosperidade, outros formam o sindicalismo de luta, cada vez mais raro em dias de crescimento econômico. Outros optam pelo banditismo, outros pela arte critica como o rap, hip hop, outros se dedicam aos estudos e ao serviço público, outros viram pequenos comerciantes, outros deixam suas classes sociais para ascender, outros mergulham na miséria e na loucura. Essa escolhas são produtos de suas trajetória individuais e sobre-determinam as determinações econômicas que é o trabalho assalariado para o mercado.

  Quando essa reação parcial de negação de uma vida voltada para o mercado de trabalho é sistemática vê-se formar um ethos insubmisso ou revolucionário. O comerciante local não quer a concorrência do grande capital, nem ter que pagar imposto, o cantor de Rap que compõe músicas de cunho critico político, o sindicalista faz propaganda política, o anarquista que faz propaganda da sua doutrina revolucionária e etc. As diversas rebeliões dos bairros de periferia demonstram isso no Brasil e no mundo. Basta comparar a resistência por exemplo da população da favela Sonho Real com Canudos e ver que apesar das derrotas dessas rebeliões, suas memórias alimentam um imaginário insubmisso, criativo e inovador, embora esse imaginário seja restrito à alguns grupos de inteligência orgânica não à população em geral.                            
 
A desocupação da favela Sonho Real em 2005, passou desapercebido do público geral, mas gerou além de músicas, o rapper GOG dedicou uma música a ela, um documentário, indignação e revolta em indivíduos de diversas classes sociais, alimentando a chama da insatisfação e sede por justiça, além de é claro somar a experiência de luta ajudando a inovar táticas de resistência e respostas políticas. Vemos isso na divulgação hoje, na recepção e na solidariedade que os movimentos de sem teto têm de grandes setores da sociedade, muito maiores que no período da frágil resistência da favela Sonho Real, resistência essa que quase passou anônima. Já a desocupação da favela Pinheirinho, alguns anos depois, por exemplo, repercutiu nacionalmente, e não foi  somente a economia do face book que difundiu a informação, antes foi uma geração de cidadãos críticos, muitos inclusive que acompanharam as parcas notícias da mídia e que assistiram aos documentários produzidos pelo centro de mídia independente à época da desocupação da favela Sonho Real ou que tiveram contato desse fato através das canções populares de GOG, cantor de rap. Vejamos outro exemplo.
 
  A resistência do povo de Canudos gerou uma das maiores obras da literatura brasileira além de popularizar o nome “favela” para os bairros pobres. Hoje Canudos se multiplicou por mil. E a cada década novas formas de resistência se somam as antigas. A desocupação da favela pinheirinho foi apoiada por manifestações em todo Brasil e depois seguiu-se um debate intenso com setores esclarecidos da sociedade, e não passou no semi- anonimato como a desocupação da favela Sonho Real cerca de 7 anos antes.

  O grande poeta e dramaturgo Bertold Brecht demonstrou com o próprio exemplo da sua vida que as determinações econômicas são um ponto de partida e, se determinam o individuo, o fazem de maneira negativa. Quando jovem Brecht abandonou a fábrica de seu pai e sua herança para lutar com o povo e mais tarde quando o delírio nazi-facista dominou a Alemanha, parecendo ser irresistível, mas uma vez ele negou o sistema e compôs;

 “Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo E examinai, sobretudo, o que parece habitual. Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de habito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer impossível de mudar.”

 Durante a década de 30 na Alemanha muitos poderiam justificar o “porquê” da adesão da maior parte da população ao nazismo como uma resposta aos fatores econômicos, somados recessão profunda, mais a humilhação do pós guerra.

  Embora esse pensamento não mostre que durante os 10 anos anteriores à era nazista, houve uma acirrada disputa pela consciência do povo entre comunistas e nazistas, o apoio da burguesia aos nazistas e a liderança carismática de Hitler foi o que deu a vitória em 1933 aos nazistas. O povo alemão escolheu Hitler por livre vontade, poderiam ter escolhido os comunistas, mas a falta de “agressividade”comunista (suas divisões e alianças com a social -democracia) vez os alemães temerem Hitler, e por fim o amaram. Nunca deixou de haver resistência na Alemanha, mesmo que ela se restringisse à oficiais do exército, como ficou claro no atentado a Hitler em 1944.  O que importa nesta questão é a diferença em relação aos hábitos políticos massificantes.

Quando se escolhe, se elege um representante com poderes absolutos anulamos nossa liberdade, embora esse ato seja ainda seja um ato de liberdade. Brecht não se iludiu com os benefícios do regime, muito menos com sua monstruosa ideologia. O nazismo foi antes determinado pela vontade do povo alemão do que pela crise econômica, o último exemplo cabal foi a divisão do parlamento alemão em 32, um ano antes a ascensão de Hitler, um terço dos deputados eram comunistas o outro terço nazista, o resto era dividido entre a social-democracia, conservadores e liberais. A derrota dos comunistas selou de morte o povo alemão, afinal eles elegeram Hitler.

 Hoje no Brasil o crescimento econômico, somado às politicas sociais, ao reajuste permanente do salário mínimo fazem-nos crer que vivemos um período de declínio da critica e de homogeneização ao centro da política. Todos parecem se tornar conservadores, entretanto as reintegrações de posse permanecem, seja no campo quanto nos centros urbanos, índios, sem tetos são as principais vítimas, existe também um massacre da população pobre e jovem. Assassinados sob o rótulo de guerra ao crime, mas seria um sintoma de conservadorismo achar que não exista resistência mesmo que na forma de poesia, música e memória, veja o último clip dos Racionais Mcs, realizado na ocupação urbana Mauá, sendo uma homenagem à vida do guerrilheiro Marighella.

  Então é de dentro das instituições burguesas através do mercado que surge a resistência, que o homem oprimido encontra a possibilidade de luta. A economia conforta os satisfeitos, os viciados, os saudáveis, mas nunca conforta o ser humano criativo e corajoso. Este tipo forma a memória do povo. São seu espírito de luta.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Ditadura eletrônica: o nascimento do “big brother” nas cidades.

O fato da guarda civil metropolitana de São Paulo inaugurar uma central de vídeo monitoramento, que entre os objetivos, além da justificativa de aumentar a segurança urbana, está a fiscalização do comércio ambulante, inibindo o comércio irregular, vandalismo e o uso “impróprio” do espaço público deveria causar no mínimo uma dúvida, a começar que este fato não pode ser compreendido como algo isolado, mas como uma política sistemática de vigilância do cidadão que está ocorrendo em todo o Brasil, diversas cidades já adotaram ou vão adotar este modelo. O combate ao comércio ambulante e irregular de certa maneira, no limite, pode aumentar a violência urbana na medida em que esse sistema, se for eficiente, poderá empurrar para o desemprego centenas de trabalhadores autônomos, isso apenas em São Paulo, aumentando no fim a violência, afinal, se o sistema inviabilizar o comércio ambulante parte destes comerciantes poderão ser tentados a virarem criminosos para obter recursos e sustentar suas famílias. Embora seja inegável um certo temor geral que causam aos criminosos e que no limite seu uso público é legítimo, mas o ganho em segurança é perda em liberdade. Este processo de instalação de câmeras pela cidade, olhos digitais dos vigias da ordem pública, se multiplica conjuntamente com o aumento de câmeras de segurança das empresas e dos condomínios nos bairros da cidade, entretanto este acontecimento não gera um questionamento por parte da sociedade civil. Estamos sendo vigiados porquê? Essa é a única forma de se combater a criminalidade? Os dados produzido por essas centrais vigilância será usado apenas por funcionários idôneos e honestos? Ou poderão ser vendidos como informação a empresas, ao google ao face book, à terceiros e talvez até para criminosos? Questionar essa cultura de certa maneira é questionar o para quêm e o para oquê elas foram construídas e se expande, não seria essa cultura as semente de uma tirania, um novo poder? O bandido, o terrorista, o vendedor ambulante por vezes é só um bode expiatório, um motivo para fomentar toda uma nova economia e domínio. O fato de por vezes o governo e o poder público ter que censurar certos vídeos na internet, chegando a prender funcionários e diretores de empresas como a google mostra o tanto que essa questão é séria. O poder público não têm poder sobre o uso e o comércio das imagens em seu poder, um exemplo disso foi a pouco tempo a divulgação das imagens da CPTM que mostra um casal fazendo sexo dentro de um vagão vazio dos trens da companhia. Ora tudo isso porém têm uma importância pequena perto das transformações a longo prazo. Os bandidos se adaptarão ao novo sistema, já estão mais sofisticados usando máscaras e a própria internet, desenvolvendo controle remotos especiais para desligar as câmeras. O grande perigo porém será a união entre esse novo poder com as novas tecnologias tais como inteligência artificial, programas de reconhecimento facial, memória digital e etc, fornecerão às futuras ditaduras recursos bem maiores aos recursos dispostos dos terríveis totalitarismo do século XX. A sombria distopia de George Orwell torna-se a cada dia menos ficção e sua realização profética se dá, por ironia, em meio a uma sociedade democrática, os futuros ditadores poderão ter a sua disposição um sistema de vigilância do cidadão gerado em nome da segurança pública, da proteção ao patrimônio privado e público. E a instalação desse programa é geral e sistematica, tanto que está sendo instalado no Brasil todo, um exemplo é a central de Recife, que também aumentará seu número de câmeras. Hoje todo membro da sociedade se familiariza-se cada vez mais com câmeras de filmar e ser filmado, não apenas com câmeras de segurança, mas com câmeras de celulares, máquinas fotográficas digitais, de certa maneira esse processo e irreversível, se a Democracia não criticar, debater e encontrar soluções reais a uma superexposição do cidadão a essa cultura, a ditadura eletrônica se instalará tranquilamente e paulatinamente financiada com nosso dinheiro, com o dinheiro dos impostos, com o trabalho das próprias vítimas, o contribuinte, o cidadão. O debate sobre segurança pública e a violência urbana não pode se limitar a uma questão técnica de vigilância e aumento do efetivo militar, mas antes deve-se ir a raiz do problema que é a grande diferença entres as classes sociais existentes no Brasil, a concentração da renda na mão de poucos, o descaso com a educação publica de qualidade, somado à corrupção endêmica de políticos empresários e da sociedade como um todo. Podemos pensar em soluções à violência urbana? É evidente que sim, a única solução é a redistribuição de renda somada a pesados investimentos em educação para as populações mais pobres, além da criação de um sistema jurídico eficiente e democrático e é claro transparente. Em vez de mais câmeras mais poder a população vítima de todo esse sistema. Questionar criticar e participar da gestão das chamadas questões “administrativas” tanto no público como no privado é um pré requisito em uma democracia, e só podemos fazer isso com educação tempo e liberdade e é claro conscientização política.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Insurreições armadas no Oriente médio.

As cenas de Mohamed Bouazizi queimando são chocantes. Ele tinha apenas 26 anos quanto se martirizou, muito pobre, órfão aos três anos, desde dos 10 vendia legumes como ambulante pelas ruas de uma cidade da Tunísia, a cidade de Bem Araus. Ele ganhava cerca de 75 dólares por mês. Sua história percorreu o mundo, depois de ter seu carrinho confiscado pelas autoridades, Mohamed protestou em frente ao prédio do governo local, não foi atendido e sem esperança deixou uma mensagem para sua mãe no face book e ateou fogo ao próprio corpo. O povo alarmado e escandalizado com a situação primeiramente se compadeceu de Mohamed, mas logo depois a ira e a revolta se espalharam como fogo em palha seca em meio a uma população pobre que a muito não suportava o regime político ditatorial, a sede por justiça desencadeou um levante popular seguido de protestos e greves por todo país, dava-se início a primavera Árabe. Logo o exemplo da Tunísia se espalhou por todo oriente médio, uma pequena fagulha despertou a consciência de muitos, todos aqueles que se sentiam humilhados explodiram em ira com seus sentimentos de liberdade e justiça a muito reprimidos, Bouazzi, desde o profeta Maomé, despertara a consciência dos povos oprimidos do deserto, ele nunca imaginara que no momento em que ateou fogo ao próprio corpo libertara não somente seu espírito, mas a consciência de milhões de pessoas em todo oriente-médio, Mohamed Bouazizi morreu cerca de duas semanas depois em decorrência das queimaduras.
O dia da desforra tinha chegado ao oriente médio, agora era a hora do acerto de contas com as oligarquias e ditaduras. Em 17 de dezembro 2010 Bouazizi ateou fogo ao próprio corpo, em 14 de janeiro de 2011, depois de semanas de violentas manifestações, Bem Ali, ditador da Tunísia à 23 anos foge para Arábia Saudita, a vitória do povo foi total, as eleições em breve iniciariam uma nova vida na Tunísia. Entretanto os levantes pelo Oriente-médio tinham apenas começado, desencadeando violentos processos políticos que se manifestavam segundo a particularidade de cada país. Em alguns países os ditadores renunciaram depois de uma luta dramática e violenta, lutas que porém não desembocaram em guerra civil, o maior exemplo disso são o Egito e o Iemem, entretanto as ferozes ditaduras da Líbia e da Síria desencadearam encarniçadas guerras civis. O Egito depois das manifestações que derrubaram Mubarak entrou em um conturbado período de transição com disputas políticas entre os grupos que outrora apoiavam o regime e grupos que eram oposição ao regime como o partido islâmico, Fraternidade muçulmana.As eleições parlamentares iniciavam a nova fase. Entretanto na Líbia e na Síria os processos geraram guerras civis com custos elevados para população de seus países, na líbia morreram cerca de 40 mil pessoas em 8 meses de conflitos violentíssimos envolvendo a ação de exércitos europeus e de forças estadunidenses sob a mascara da OTAM com o aval da ONU.
Embora a atuação das forças estrangeiras na Líbia não se restringisse à campanha aérea, pois muito apoio em solo foi dado aos rebeldes Líbios através da ação de espiões e a atuação de forças especiais, a OTAM não chegou a operar com forças regulares. Entretanto a batalha pela Líbia foi a mais importante guerra civil desde a guerra civil Espanhola, tanto pela sua localização estratégica no mediterrâneo, como pelo seu papel político no contexto africano. O regime de Muamar Kadafi foi responsável pela criação de um banco africano para minar a influência do FMI na África além ter financiado diversos movimentos de libertação na África, soma-se isso a um extenso histórico de embates com o ocidente que vão desde ações terroristas como a explosão do Lockerbie (Escócia) que resultaram na morte de centenas de pessoas, além de ter armado a guerrilha do Ira entre outros movimentos anti-imperialistas. Essa postura internacional independente da Líbia não refletia os conflitos internos do país com a brutal ditadura de Muamar Kadafi, estima-se que em 42 anos de ditadura cerca de 40 mil pessoas tenham perecido nas mãos de regime de Trípoli. Um dos últimos grandes massacres foi a execução de 1600 prisioneiros em 1996 realizada como uma espécie de queima de arquivo pelo regime ditatorial Líbio, esse massacre transformou a terrível prisão de Abu Salim na Bastilha do regime Líbio a libertação de prisioneiros de Abu Salim foi um dos grandes momentos da guerra civil
Kadafi morreu sem julgamento executado por milicianos Líbios, entretanto seu histórico de crimes e estupros e violações contra seu povo fez de sua execução uma espécie de linchamento público para o deleite das milhares de famílias que foram violadas pelo seu regime, de certa maneira não podia se esperar algo melhor. Depois da queda de Trípoli Kadafi se refugiou em sua cidade natal Sirte, seu regime era tribal, ele possuía um apoio popular no oeste da Líbia em especial de sua tribo e das tribos nômades do deserto os tuaregues, além de ter mantido até ao final o apoio de tribos como os Zentan e Taruna. A batalha final foi brutal, de um lado cerca de 6000 mil milicianos armados com o arsenal do próprio Kadafi, apoiados por um pesado bombardeio dos caças da Otan, em especial os Dassault Mirrage franceses, do outro lado cerca de 1500 homens, os restos do exército do ditador, polícia secreta e apoiadores populares de Sirte, nas duas primeiras semanas centenas de civis morreram no fogo cruzado entre o fiéis seguidores do tirano Líbio e seus inimigos rebeldes/OTAN. Depois de negociações e um curto cessar fogo para deixar a população fugir, junto com elementos chaves do regime, algum dos quais foram presos pelos rebeldes a batalha recomessa.Suspenso o cessar fogo, mais três semanas de intensos conflitos e em meio à um montão de escombros chega ao fim a guerra civil na Líbia. Os últimos momentos de Muamar Kadafi mostraram a brutalidade do conflito e ensinou que para muitos ditadores cruéis o fim é igualmente terrível ao destino de suas vitimas, tal como Hitler, Mussolini, mais recentemente Nicolae Ceausescu.
Nas suas últimas horas de sua vida Kadafi sentia a terra tremer constantemente. Uma chuva permanente de foguetes, granadas, mísseis grads e bombas made in OTAN fez o ditador escolher pela fuga com o resto de seus seguidores, cerca de 80 a 100 homens. O comboio de caminhonetes e carros partem em direção ao deserto, os caças franceses cuidam de interceptá-los, o final já conhecemos, capturado dentro de um cano de esgoto Kadafi é linchado, torturado e morto, seu filho Mutassim e seu general executados com um tiro, as cenas de Mutassin minutos antes de ser executado fumando um cigarro indica certo tratamento “humano”, aparentemente ele pode fumar, orar e escolher o local do tiro, bem em cima do coração. O motorista de Kadafi foi feito prisioneiro e é dele que provem o relato dos últimos momentos do tirano um homem irado, confuso, que olhava sempre para o norte, amaldiçoava o povo a quem ele atribuía ingratidão, mas ante aos inúmeros pedidos de fuga de seus homens ele sempre repetia que preferia morrer nas mãos do povo do que ser capturado pela OTAN e ser levado ao tribunal internacional. Segundo o motorista a ordem de “fuga” em plena luz de dia foi uma ordem de suicídio.
Podemos dizer que foi a intervenção da OTAN que garantiu uma rápida vitória aos rebeldes, apesar de sua vantagem numérica os rebeldes careciam de armamento pesado e blindados e de uma força aérea, entretanto demonstraram sua força ao realizar um levante popular em todas as cidades importantes da Líbia, dois terços do exército passou para o lado dos rebeldes, mas isso não garantiu uma vitória imediata, o regime manteve as principais unidades fiéis e com isso reuniu grande parte dos equipamentos e blindados além de manter a ordem na força aérea. Dezenas de pilotos foram executados e centenas de cadetes presos por se negarem a obedecer as ordens do ditador.Entretanto o regime já era um peso nas relações comerciais com o ocidente, além de ter um histórico desagradável de intervencionismos. Como nos últimos anos Kadafi estava valorizando relações econômicas com a China e Rússia a intervenção da OTAN foi crucial para manter a hegemonia do ocidente no mediterrâneo e garantir a vitória dos rebeldes.
Na Síria a questão é mais delicada e obscura, é sabido que a muito há uma oposição armada que luta contra a sanguinária ditadura de Bashar Assad entretanto as manifestações populares da primavera Árabe seguido dos massacres expos as debilidades do regime, um grande contingente de soldados se rebelou contra o regime e formaram o Exercito livre da Síria, acredita-se que inicialmente cerca de 15 a 20 mil soldados tenha se rebelado e que hoje o Exército livre da Síria chegue a 40 mil homens, mal armados e mal equipados, entretanto muito coesos politicamente ao ponto de resistir meses sem o apoio real dos países “inimigos” da Síria, armados apenas com armas leves, lança foguetes e granadas travam uma luta heróica contra a máquina de moer carne humana que sustenta a tirania Síria. O regime Sírio se sustenta devido a eficiência das suas forças de repressão, acredita-se que só nos últimos meses 10.000 civis tenham morrido nas mãos das forças do regime.
A batalha da Síria é diferente, não virá ajuda da OTAN, essa guerra irá durar muito tempo e nos legará mais lições que a batalha da Líbia, apesar dos rebeldes terem conseguido certa ajuda financeira a guerra segue indeterminada, seriam capazes os rebeldes de minar as forças do regime através de uma guerra popular? Essa questão e mais outras só o tempo as esclarecerá, o que sabemos é que há uma oposição política na Síria representada pela Fraternidade islâmica e que as armas dos rebeldes Líbios estão a disposição dos homens livres da síria, entretanto falta um “corredor” para que esse armamento chegue.
A maior lição que as insurreições armadas nos passam é que o preço da liberdade é caro e que uma saída política sempre evita traumas de uma guerra civil e que na política a maioria pode vencer a minoria, mas em uma guerra civil a questão da guerra suplanta a questão da política e o armamento torna-se mais importante que a palavra que o debate, por isso é mais importante evitar uma guerra civil do que vencê-la, o Egito demonstra a grandeza de suas organizações populares e de seu exército na medida que caminha para democracia através da luta política. O Iêmen, a Tunísia seguem a trilha do Egito, outros países como a Argélia, Iraque, Omã encaminham reformas, e tudo isso nos faz crer que as guerras civis demonstram que nem todos regimes do oriente médio eram ditaduras fortes com exceção da Líbia e da Síria.

sexta-feira, 2 de março de 2012

David Harvey: anti-capitalismo e marxismo.

A passagem de David Harvey por são Paulo foi marcada por uma forte presença de estudantes universitários. O “Tuca” o famoso anfiteatro da PUC ficou apertado para acomodar as mais de mil pessoas que foram lá ouvir o geógrafo e intelectual marxista. Na USP não foi diferente, embora o anfiteatro da faculdade de arquitetura fosse menor e o público presente maior que na PUC, o que acabou deixando centenas de pessoas para fora, a quais tiveram que acompanhar a palestra através do telão improvisado de última hora.
Em suas palavras David Harvey declarou que acredita na classe trabalhadora como a classe revolucionaria da história e que o socialismo ainda é possível, só que no século XXI a disputa não será pela fábrica mas pela cidade. A cidade é o novo campo de batalha da luta de classes. Harvey acredita que sua idéia não é uma novidade pois as maiores experiências revolucionárias partiram da cidade, como a primavera dos povos (1848) a comuna de Paris, ou 68. Atualmente ele apontou os movimentos “ocupy Wall Street”, os protestos anti-globalização e as manifestações contra guerra do Iraque como exemplos contemporâneos de luta anti-sistema. Discorreu sobre vários temas, suas análises não se prenderam as divisões disciplinares, talvez por isso obra alcance um público tão grande, como geógrafos, sociólogos, cientistas políticos, e economistas. Soma-se a isso o fato dos seus livros terem um texto fluido e didático que reforçam essas características interdisciplinares. Harvey têm a desenvoltura de um grande pensador, analisou as dinâmicas do capital, seu movimento sistêmico, enfocou as relações entre urbanização e produção de capital, além discorrer sobre formas de resistência e alternativas de luta.
Harvey também de maneira lúcida, apesar da critica ao capitalismo, ressaltou que no capitalismo aconteceu e acontecem coisas boas, tais como o desenvolvimento da capacidade de produção, a ciência e a tecnologia, e a própria possibilidade do socialismo que surge das contradições da sociedade capitalista. Ressaltou que a crise atual é controlada e que o capitalismo necessita da produção da pobreza, ele citou dados que demonstram o crescimento em todo o mundo desde 2008 do número de bilionários, ricos que aumentaram suas riquezas devido a especulação financeira, números estes acompanhados do aumento do desemprego e da miséria em todo mundo afetado pela crise. No capitalismo, segundo Harvey, o processo de concentração de riqueza é constante. Harvey ressaltou também um processo que ele chamou de externalização das necessidades do capital, que repassa para as classes pobres os custo da produção, através da exploração do trabalho e da espoliação dos direitos civis.
De certa maneira os dois dias de palestra em São Paulo deram a chance ao publico brasileiro de conhecer seu pensamento de uma perspectiva geral e atualizada. No Brasil Harvey é conhecido pelo seu livro mais famoso “A condição pós-moderna”, considerado, segundo alguns professores que apresentaram a palestra de Harvey , como um dos 50 livros mais importantes do pós-guerra. O evento foi promovido pela editora Boi Tempo, para lançar seu novo livro “O enigma do capital”. Ao final do evento o representante da editora no anfiteatro da FAU de maneira irradiante anunciou o esgotamento da primeira edição do livro, centenas de pessoas ao longo dos dois dias compraram os estoques do livro “O enigma do capital” da banca da editora, que expôs seus livros ao longo do evento.
David Harvey se mostrou extremamente simpático, piadista e atencioso, sua palestra se dividia em duas partes, a primeira, com cerca de uma hora, era uma apresentação de seu pensamento, na realidade uma exposição da crise econômica, depois na segunda parte, ele respondia as dúvidas de seu inquieto público anticapitalista.
Harvey dedicou cerca de uma hora para responder as inúmeras questões do seu público, depois abriu para uma sessão de autógrafos, abraços e fotos. Ao longo dos eventos ressaltou a importância da luta anti-capitalista, e por vezes mostrou simpatia por pensadores anarquistas como Kropotkin, Elisée Reclú, e pensadores anti-autoritários como Michel Foucault, todos eles, segundo Harvey, foram grandes geógrafos e críticos do capitalismo. Na nossa lembrança ficará a camiseta vermelha a calça preta e seu entusiasmo juvenil que ressaltava junto com a barba e os cabelos brancos uma disposição para o novo e para a revolução através da luta anticapitalista. Mais do que aos brasileiros Harvey se surpreendeu com o Brasil, e repetiu nas duas palestras olhando para o publico a sua alegria em constatar que o marxismo estava vivo, assim como Marx, para um publico que sorria lisonjeado pelas palavras do velho pensador marxista.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

O Império quer um imposto global.

Nos últimos anos com o desemprego crescente na Europa e nos Estados unidos, o declínio do consumo dos países ricos, somados aos protestos e manifestações populares por todo mundo antigo, em especial na Europa e oriente médio, mais a nova escalada armamentista, geraram uma perspectiva ao mesmo tempo nova e terrível para milhões de seres humanos. A atual crise econômica é a terceira de uma série de três recessões profundas sofridas pelo capitalismo. A primeira de 1873 a 1896, teve como conseqüência um acirramento do imperialismo Europeu, que foi usado como solução às fortes contradições econômicas do período empurrando a Europa para a primeira grande guerra.
A segunda crise, de 1929 à 1939, acabou por levar à ascensão o nazifacismo europeu, como resposta às revoluções comunistas do período. Teve como conseqüência a Segunda Grande Guerra. Evidentemente nos perguntamos quais seriam as conseqüências da crise atual , já que para uma economia como a de nosso país, crises como essas produzem certas oportunidades para desenvolvimento e transformação, mesmo que a longo prazo a guerra se vislumbre no horizonte.
Muitas foram as estratégias da burguesia financeira para controlar as conseqüências políticas da crise econômica. Nos primeiros meses da crise a mídia capitalista a todo custo queria desvincular a crise de suas raízes produtivas enfocando-a como uma crise financeira apenas, como mais uma crise de “ativos” atrelada apenas a virtualidade das bolsas de valores. A solução de início era clara bastava criar novos ativos sob a forma de impostos sob carbono. Alardeava -se aos quatro ventos a questão do “aquecimento global” entretanto depois da conferencia do “clima” em Copenhagen em 2009 o discurso mudou, veremos porque.
Uma das estratégias foi destacar nas manchetes do período o “aquecimento global”, enquanto isso os governos dos países desenvolvidos financiavam encontros para discutir e aprovar os chamados “impostos sob a emissão de carbono”, mas essa estratégia não era gratuita como veremos mais a frente. Por um tempo, este bode expiatório midiático deu certo até ficar claro, com a revelação feita por hakers de uma troca de e-mails de mais de 13 anos entre os cientistas responsáveis pelo IPCC, que na última década esses mesmos cientistas tinham sido financiados pelo governo inglês e pela ONU para empurrar para cima a média dos registros da temperatura do período, retocando o aquecimento global.


O plano consistia na seguinte estratégia: os EUA e Inglaterra seriam os financiadores majoritários do primeiro imposto mundial, portanto credores do novo sistema financeiro baseado no imposto sobre o carbono, financiando assim a saída de suas economias da crise, e criando as bases para um estado global, logo um governo mundial.

A gota d’água porém foi o vazamento, antes do fim encontro, na conferência de Copenhagen, em fins de 2009, do acordo pronto feito entre EUA e Inglaterra, que somado aos protestos e combates de rua de militantes anticapitalistas de toda Europa nas proximidades Copenhagen, antecipou o grande protesto interno: a saída indignada dos países africanos, seguido dos protestos do Brasil, Índia e China. O encontro de Copenhagen acabou sem acordo. O evidente encobrimento da crise com o discurso ambiental, seguido de um aumento de impostos caiu por terra. Desde então a ideologia ambiental capitalista teve que mudar rapidamente sua forma, dada a queda da tese do “aquecimento global” e da idéia de “crise financeira”. Hoje o termo mudança climática, ou crise ambiental, passou a ser muito mais usado pela mídia, pois é mais adequado para esconder a disputa que os estados desenvolvidos e suas empresas realizam sobre os recursos humanos, as populações e seus biomas, em especial a guerra por petróleo. Entretanto mesmo que essa diferenciação de bioma e recursos humanos seja apenas um recurso didático, já é evidente que a maior riqueza do planeta terra é sua população com sua força de trabalho.


Logo a estratégia para criação de imposto sobre o carbono tinha como argumento a idéia de que a crise econômica seria uma crise “financeira” de “ativos”, como se fosse algo ligado apenas à “virtualidade” dos painéis da bolsa. Os EUA com o apoio da Inglaterra e Europa, criariam “novos ativos” sob a forma do “imposto carbono” sobre os países mais pobres para “salvar o planeta”, estabelecendo limites para industrialização dos países pobres, impedindo esses estados em industrialização de sobrecarregarem a produção capitalista com os seus produtos produzidos por máquinas movidas à derivado de petróleo e carvão. Com isso ela tornaria os países mais dependentes de sua nova “economia verde”. Pelo acordo, os EUA se eximiriam de reduzir seu CO2 em troca do financiamento do fundo.
Ficou a cargo de toda mídia global propagandear o processo como um benefício, um avanço em direção a uma “economia ambientalmente sustentável”, escondendo as razões reais, que eram: passar a conta da crise para os países pobres, além de prescrever mais de 100 impostos criados contra as populações de todos os países do mundo, impostos sobre pessoa física que funcionariam como meio de controle sobre as classes sociais mais pobres pelas elites de cada país do globo. A África, os BRICs e a população trabalhadora dos países desenvolvidos é que deveriam pagar pela recessão. A grande ironia era que a desculpa para os impostos era “salvar a natureza e o meio ambiente”.


Entretanto essa luta a humanidade venceu, mesmo com meios de comunicação hegemônicos mascarando cinicamente o que ocorria no encontro e que o estopim dessa crise foi uma lógica inerente à economia capitalista de superprodução, que se efetivou com a valoração desmesurada no setor imobiliário da economia norte americana, a maior economia do planeta, isto somado a má gestão dos recursos financeiros dos EUA, que além de ser a única superpotência foi o grande modelo econômico do mundo atual.
Acabado o encontro, salva a economia dos países pobres, a contradição continuou, pois devemos lembrar que a importância dos EUA não é apenas econômica. Já era consenso entre economistas que as economias dependentes diretamente dos EUA seguiriam o mesmo curso. Entretanto a mídia, durante todo o ano de 2009 difundiu aos quatro ventos que o pacote de trilhões de dólares e euros teria sido suficiente para conter a crise e salvar as economias. Passado pouco mais um ano do início da crise, em 2010 foi a vez da economia Européia de entrar na recessão.

Mais uma vez os fatos desmascararam a ideologia que tentava através de seu discurso converter a crise do setor produtivo em uma crise momentânea do capital, que criava uma imagem estática do mundo em que o capitalismo se eterniza. Vimos como os fatos forçam e fazem saltar as contradições dessas imagens sedutoras de uma economia regulável, mas para tanto devemos reconhecer outras razões além das econômicas.