sexta-feira, 2 de março de 2012

David Harvey: anti-capitalismo e marxismo.

A passagem de David Harvey por são Paulo foi marcada por uma forte presença de estudantes universitários. O “Tuca” o famoso anfiteatro da PUC ficou apertado para acomodar as mais de mil pessoas que foram lá ouvir o geógrafo e intelectual marxista. Na USP não foi diferente, embora o anfiteatro da faculdade de arquitetura fosse menor e o público presente maior que na PUC, o que acabou deixando centenas de pessoas para fora, a quais tiveram que acompanhar a palestra através do telão improvisado de última hora.
Em suas palavras David Harvey declarou que acredita na classe trabalhadora como a classe revolucionaria da história e que o socialismo ainda é possível, só que no século XXI a disputa não será pela fábrica mas pela cidade. A cidade é o novo campo de batalha da luta de classes. Harvey acredita que sua idéia não é uma novidade pois as maiores experiências revolucionárias partiram da cidade, como a primavera dos povos (1848) a comuna de Paris, ou 68. Atualmente ele apontou os movimentos “ocupy Wall Street”, os protestos anti-globalização e as manifestações contra guerra do Iraque como exemplos contemporâneos de luta anti-sistema. Discorreu sobre vários temas, suas análises não se prenderam as divisões disciplinares, talvez por isso obra alcance um público tão grande, como geógrafos, sociólogos, cientistas políticos, e economistas. Soma-se a isso o fato dos seus livros terem um texto fluido e didático que reforçam essas características interdisciplinares. Harvey têm a desenvoltura de um grande pensador, analisou as dinâmicas do capital, seu movimento sistêmico, enfocou as relações entre urbanização e produção de capital, além discorrer sobre formas de resistência e alternativas de luta.
Harvey também de maneira lúcida, apesar da critica ao capitalismo, ressaltou que no capitalismo aconteceu e acontecem coisas boas, tais como o desenvolvimento da capacidade de produção, a ciência e a tecnologia, e a própria possibilidade do socialismo que surge das contradições da sociedade capitalista. Ressaltou que a crise atual é controlada e que o capitalismo necessita da produção da pobreza, ele citou dados que demonstram o crescimento em todo o mundo desde 2008 do número de bilionários, ricos que aumentaram suas riquezas devido a especulação financeira, números estes acompanhados do aumento do desemprego e da miséria em todo mundo afetado pela crise. No capitalismo, segundo Harvey, o processo de concentração de riqueza é constante. Harvey ressaltou também um processo que ele chamou de externalização das necessidades do capital, que repassa para as classes pobres os custo da produção, através da exploração do trabalho e da espoliação dos direitos civis.
De certa maneira os dois dias de palestra em São Paulo deram a chance ao publico brasileiro de conhecer seu pensamento de uma perspectiva geral e atualizada. No Brasil Harvey é conhecido pelo seu livro mais famoso “A condição pós-moderna”, considerado, segundo alguns professores que apresentaram a palestra de Harvey , como um dos 50 livros mais importantes do pós-guerra. O evento foi promovido pela editora Boi Tempo, para lançar seu novo livro “O enigma do capital”. Ao final do evento o representante da editora no anfiteatro da FAU de maneira irradiante anunciou o esgotamento da primeira edição do livro, centenas de pessoas ao longo dos dois dias compraram os estoques do livro “O enigma do capital” da banca da editora, que expôs seus livros ao longo do evento.
David Harvey se mostrou extremamente simpático, piadista e atencioso, sua palestra se dividia em duas partes, a primeira, com cerca de uma hora, era uma apresentação de seu pensamento, na realidade uma exposição da crise econômica, depois na segunda parte, ele respondia as dúvidas de seu inquieto público anticapitalista.
Harvey dedicou cerca de uma hora para responder as inúmeras questões do seu público, depois abriu para uma sessão de autógrafos, abraços e fotos. Ao longo dos eventos ressaltou a importância da luta anti-capitalista, e por vezes mostrou simpatia por pensadores anarquistas como Kropotkin, Elisée Reclú, e pensadores anti-autoritários como Michel Foucault, todos eles, segundo Harvey, foram grandes geógrafos e críticos do capitalismo. Na nossa lembrança ficará a camiseta vermelha a calça preta e seu entusiasmo juvenil que ressaltava junto com a barba e os cabelos brancos uma disposição para o novo e para a revolução através da luta anticapitalista. Mais do que aos brasileiros Harvey se surpreendeu com o Brasil, e repetiu nas duas palestras olhando para o publico a sua alegria em constatar que o marxismo estava vivo, assim como Marx, para um publico que sorria lisonjeado pelas palavras do velho pensador marxista.